E não é que de repente eu fiquei sem voz?
Sério. Quando a gente para pra pensar, falar sobre a voz é algo tão complexo, que a gente nem sabe por onde começar. É que poucas coisas são tão importantes para a existência humana quanto a fala, e por tabela, a voz. Uma das primeiras formas de comunicação, era o principal meio de transmissão de conhecimento de uma geração à outra. Isso, antes de imaginarmos qualquer tipo de linguagem escrita. Eu resumiria nossa evolução assim: fogo, voz, escrita, iPhone. Pronto, é mais ou menos isso (bem, talvez precisasse entrar “Gisele Bündchen” em algum lugar nessa equação, mas é só minha opinião). 🙂
Como fotógrafo, diretor de arte e escritor, minha voz sempre foi outra. Ou melhor, outras: luz na fotografia, imagem e tipografia no desenho gráfico, palavras e pontos de exclamação nos textos. Pessoalmente, nasci com essa mania insistente de uma representação gráfica tangível de tudo, na forma como me expresso e represento o mundo que percebo à minha volta.
Mas não é impressionante que você ME IMAGINA GRITANDO QUANDO LÊ ALGO ESCRITO ASSIM? (…ou sussurrando, se em seguida escrevo assim?). E quem consegue não ouvir um choro ecoando quando vê as fotos da série Êxodos, do Sebastião Salgado?
E é nesse ponto que eu queria chegar: a voz é indissociável do imaginário humano. Mesmo quando não se ouve, ela está lá. O mesmo ocorre quando eu digo: imagine essa frase sendo narrada pela Fernanda Montenegro. Pronto, você está ouvindo a voz dela lendo isso, lá no fundo da sua cabeça. É como se a voz tornasse o mundo mais palatável. Como se traduzisse – de forma instintiva-ancestral – a porra toda. Até pra Deus demos uma voz! Um uníssono coletivo da voz de todos nós, através da “voz do povo”. Isso me faz pensar que se os olhos são a janela da alma, a voz é o interfone. E não é à toa que “voz” é sinônimo de “expressão”. Vai muito além da simples ferramenta de comunicação e das frias definições teóricas que determinam emissor, receptor e mensagem.
A voz traz pra fora, aquilo que carregamos dentro. Expõe mentiras, desejos, medos e inseguranças. Exprime certezas e dúvidas, alegrias e tristezas. Nos representa muito bem na nossa complexidade ambígua humana. Seja numa locução, na música, na fotografia, num quadro ou num texto. Coincidência – ou sabedoria divina – aquela que tem a responsabilidade de expressar nossa alma, não podia ter escolhido lugar melhor para nascer. Bem ao lado do coração, no fundo do peito, brota de um sopro. Assim como a vida.
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Andrei Polessi é diretor de arte, fotógrafo, escritor e Head of Branded Content da Pitaya Filmes. Co-fundador do Instituto Dharma, organização que promove ajuda humanitária em diversos países pelo mundo.